quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

E agora José?

Confesso que quando soube da votação da CPMF no Senado Federal, fiquei muito pensativo.
Não gritei comemorando os parcos reais que irão sobrar na minha vetusta conta bancária, tampouco ridicularizei o governo pela derrota na votação.
Ninguém é tão fraco das idéias pra imaginar que certamente irá ocorrer retaliações. Óbvio que os mais abastados e a classe pobre, não irá perceber em nada o provável aumento da carga tributária, em virtude da inexistência da verba oriunda da CPMF, a partir de 1 de janeiro de 2008. Como bem se sabe, menos de 20% da arrecadação da CPMF era de fato destinada à saúde pública, todo o resto, era pra pagar cartão de crédito institucional, as esmolas públicas, e despesas parlamentares. Assim, o SUS não irá piorar nem melhorar. Em suma, a CPMF não faz muita falta pra saúde pública não.
Porque digo que a classe média irá sofrer? Porque é a única que não dispõe de meios para fugir, escapar da voracidade fiscal!
Para a manutenção da política assistencialista, bolsa escola, vale gás, etc e tal, vai precisar ser feito um rearranjo da distribuição da receita, além de, tapar o buraco que a CPMF vai deixar.
Não precisa ser vidente que a reforma tributária, que há anos se aguarda, não vai sair nos próximos 6 meses, muito menos para saber que a corrupção que mingua o erário público, não vai cessar ou diminuir para equalizar as contas.
Portanto, estou temeroso do que está por vir.
Para aliviar um pouco essa angústia, e trazer poesia ao blog, reproduzo uma de vulto da literatura brasileira. Espero que apreciem e os deixo com Carlos Drummmond de Andrade.

    JOSÉ

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio - e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?

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