Não gritei comemorando os parcos reais que irão sobrar na minha vetusta conta bancária, tampouco ridicularizei o governo pela derrota na votação.
Ninguém é tão fraco das idéias pra imaginar que certamente irá ocorrer retaliações. Óbvio que os mais abastados e a classe pobre, não irá perceber em nada o provável aumento da carga tributária, em virtude da inexistência da verba oriunda da CPMF, a partir de 1 de janeiro de 2008. Como bem se sabe, menos de 20% da arrecadação da CPMF era de fato destinada à saúde pública, todo o resto, era pra pagar cartão de crédito institucional, as esmolas públicas, e despesas parlamentares. Assim, o SUS não irá piorar nem melhorar. Em suma, a CPMF não faz muita falta pra saúde pública não.
Porque digo que a classe média irá sofrer? Porque é a única que não dispõe de meios para fugir, escapar da voracidade fiscal!
Para a manutenção da política assistencialista, bolsa escola, vale gás, etc e tal, vai precisar ser feito um rearranjo da distribuição da receita, além de, tapar o buraco que a CPMF vai deixar.
Não precisa ser vidente que a reforma tributária, que há anos se aguarda, não vai sair nos próximos 6 meses, muito menos para saber que a corrupção que mingua o erário público, não vai cessar ou diminuir para equalizar as contas.
Portanto, estou temeroso do que está por vir.
Para aliviar um pouco essa angústia, e trazer poesia ao blog, reproduzo uma de vulto da literatura brasileira. Espero que apreciem e os deixo com Carlos Drummmond de Andrade.
- JOSÉ
E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?
Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?
E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio - e agora?
Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?
Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?
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